A participação da Coppe/UFRJ e de seus professores como autores do quinto relatório de avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), divulgado em 2014, foi destacada em artigo publicado na edição online da Nature Climate Change, do grupo Nature, a mais prestigiada publicação da área de ciências atmosféricas e mudanças climáticas do mundo. De acordo com o artigo “Patterns of authorship in the IPCC Working Group III report”, que mostra a representatividade global dos autores dos capítulos do Grupo de Trabalho III do relatório, a UFRJ, por meio da Coppe, se encontra na 16ª posição no ranking das 30 instituições mais representadas no relatório.
Os professores da Coppe Luiz Pinguelli Rosa e Roberto Schaeffer, do Programa de Planejamento Energético (PPE); Suzana Kahn Ribeiro e Marcio D’Agosto, do Programa de Engenharia de Transportes (PET) e a pesquisadora Maria Silvia Muylaert de Araujo, doutorada no PPE da Coppe, foram citados no artigo, que teve como foco os cientistas coautores do WG III no Relatório de Avaliação 5 do IPCC. Ao todo somam 273 pesquisadores coautores de pelo menos duas publicações científicas, além do próprio relatório do IPCC. O grupo abrange os autores-coordenadores: dois cientistas por capítulo; os autores-líderes, que geralmente são de dez a doze por capítulo; e os autores-revisores, responsáveis pelo acompanhamento das revisões requeridas, que são dois ou três por capítulo.
O artigo, divulgado em setembro de 2015, apresenta as instituições onde trabalham e se doutoraram os cientistas que atuaram como autores dos capítulos do mais recente relatório do IPCC. Nesse grupo, a UFRJ, por meio da Coppe, aparece na 16ª posição, entre as 30 instituições mais representadas no relatório, ficando à frente das universidades de Tóquio (17ª), de Londres (18ª), e de Princeton (23ª). A relação é encabeçada pelo Banco Mundial, que apesar de sediado em Washington, não é considerado pelo estudo uma instituição norte-americana, mas sim uma organização internacional. Em segundo lugar aparece a Universidade da Califórnia-Berkeley (Estados Unidos) e, na sequência, o International Institute for Applied Systems Analysis (Áustria) (3º); a Universidade de Harvard (4º); e a Universidade de Cambridge (5º). Como considera o local de trabalho atual ou passado, bem como o local de doutoramento dos autores, a lista reúne tanto universidades quanto organizações em geral.
Os autores do artigo, professores Esteve Corbera, da Universidade Autônoma de Barcelona; Laura Calvet-Mir, da Universidade Aberta da Catalunha; Hannah Hughes; e Matthew Paterson, da Universidade de Ottawa, analisaram o país de origem dos autores do Grupo de Trabalho III, dedicado à mitigação das mudanças climáticas, e os países onde esses cientistas se doutoraram e trabalharam ou trabalham atualmente. A proposta era verificar se a predominância de pesquisadores de uma determinada região poderia resultar em um desequilíbrio de visões entre os autores dos capítulos do relatório do IPCC, cuja intenção é produzir análises equilibradas e abrangentes o máximo possível.
Baseado em uma métrica que levou em consideração o número de coautorias científicas entre os autores do relatório do IPCC, o artigo publicado na Nature Climate Change apresenta um quadro destacando os cientistas-autores com maior pontuação (colaboração científica), segundo a métrica adotada, dentro da rede de coautoria de artigos. A lista destaca o nome do professor da Coppe, Roberto Schaeffer. Colaborador do IPCC desde 1998, o professor do Programa de Planejamento Energético (PPE) aparece entre os cinco primeiros, de uma relação dos 20 autores de diferentes países com maior pontuação, do total de 273 autores do relatório.
“O artigo faz uma análise interessante e mostra o grau de colaboração e internacionalização dos autores, que formam, entre si, uma rede de contribuições, que resulta em uma vasta produção de artigos científicos. O trabalho mostra a boa inserção internacional dos autores da Coppe”, avalia o professor Roberto Schaeffer. Segundo ele, o artigo publicado na Nature Climate Change aponta
que o Brasil tem um papel relevante no GT III do IPCC e que a Coppe se destaca entre as instituições dos autores brasileiros.
Equilíbrio entre os hemisférios Norte e Sul
O estudo mostra um equilíbrio entre os hemisférios Norte e Sul, quando trata do país de origem dos autores do IPCC. Segundo o professor Roberto Schaeffer, cerca de 43% dos autores do WG III são oriundos de países em desenvolvimento ou com economias em transição.
“Entretanto, a pesquisa mostra uma predominância dos Estados Unidos e do Reino Unido quando são levados em conta os países em que os autores se doutoraram, trabalharam ou trabalham atualmente”, explica Roberto Schaeffer. Fator que, de certa forma, pode moldar as visões e análises apresentadas pelos cientistas nos relatórios. Da lista das 30 instituições mais representadas no artigo, dez são dos Estados Unidos, oito do Reino Unido, oito são consideradas organizações internacionais, e as outras quatro estão localizadas no Brasil, na Itália, no Japão e no México.
“Há um domínio da visão dos representantes dos Estados Unidos, seguido da União Europeia. Depois, mas bem mais distante, vem o Japão”, avalia o diretor de Relações Institucionais da Coppe, Luiz Pinguelli Rosa. “Existe uma predominância de cientistas de países industrializados, representados em maior número”, explica o professor Emilio La Rovere, do Programa de Planejamento Energético (PPE) da Coppe.
Pesquisadores da Coppe participam do IPCC desde o segundo relatório
Os pesquisadores da Coppe se dedicam ao estudo das questões relacionadas às mudanças climáticas ainda na década de 1980. Com o IPCC, há um longo histórico de colaborações que iniciou em 1992, quando o professor Emilio La Rovere participou como autor-líder de um capítulo do GT III, no segundo relatório de avaliação, lançado três anos mais tarde. Desde então, o professor do PPE participou de todos os relatórios lançados pelo IPCC. Na sequência, o Painel começou a contar com a colaboração do professor Luiz Pinguelli Rosa, também do PPE.
Juntaram-se a eles, os professores Roberto Schaeffer (PPE); Suzana Kahn Ribeiro, do Programa de Engenharia de Transportes (PET), que foi autora, revisora e coordenadora de capítulos e vice-presidente do GT III do IPCC entre 2010 e 2015, Marcio D’Agosto (PET) foi autor. Os professores Marcos Freitas (PPE) e Segen Estefen, do Programa de Engenharia Oceânica (Peno) contribuíram, no passado, com relatórios especiais do IPCC. Além dos relatórios de avaliação, o IPCC produz os chamados special reports voltados a temas específicos. Também participaram como autoras as pesquisadoras do PPE Maria Silvia Muylaert de Araujo e Carolina Dubeux, esta colaborando no GT II.
“Nos anos 80 as questões energéticas estavam cada vez mais relacionadas às questões ambientais”, recorda o professor Emílio La Rovere, explicando o interesse natural dos professores do PPE pelos assuntos ligados às mudanças climáticas.Mas foi na década seguinte que as contribuições foram intensificadas. “A realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92) deu um forte impulso às ações do IPCC”, recorda o professor Luiz Pinguelli Rosa, da Coppe, que na época coordenava o Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, que promoveu um evento paralelo à Rio-92. “A partir dessa época foram criados grupos de cooperação Sul-Sul com a participação de representantes de instituições do Brasil e de países da Ásia e da África”, recorda Pinguelli. Foi criado, também, um grupo de trabalho reunindo professores e pesquisadores da Coppe, do Instituto de Economia da UFRJ, do Inpe, da USP e da Unicamp. Tudo isso contribuiu para estimular ainda mais o interesse pelo estudo das mudanças climáticas no Brasil.
A partir dos estudos realizados, os professores da Coppe passaram a receber constantemente convites do IPCC. A Coppe, por meio de seus pesquisadores, participou de todos os relatórios de avaliação, desde a segunda edição, lançada em 1995. Na sequência, vieram o terceiro relatório, de 2001, o quarto (2007), que recebeu o Prêmio Nobel da Paz (naquela edição divido com o ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore), e o mais recente, concluído em 2014.
“A Coppe tem uma tradição muito forte na área de energia e quando se fala em mudanças climáticas os dois grandes eixos são desmatamento e energia”, destaca a professora da Coppe, Suzana Kahn Ribeiro, que atualmente coordena o Fundo Verde da UFRJ e preside o Comitê Científico do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas.
Para Suzana Kahn, a tradição da Coppe na área de energia contribuiu para a realização de estudos sobre mitigaçãoEm paralelo à participação das instituições brasileiras no IPCC, o Brasil acompanhou o surgimento de fóruns e grupos dedicados à discussão das mudanças do clima. Entre eles estão o Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC), que desde 2004 está sediado na Coppe, e o Painel Nacional de Mudança do Clima (PNMC), criado em 2009. Foram criadas também áreas e secretarias dedicadas à questão no então Ministério da Ciência e Tecnologia e no Ministério do Meio Ambiente.
Outras instituições brasileiras, como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Universidade de Brasília (UnB), entre outras, também têm dado importantes contribuições para elaboração dos relatórios do IPCC, atuando no Grupo de Trabalho I, que estuda as bases das ciências físicas, e no Grupo de Trabalho II, que é dedicado ao estudo dos impactos ambientais, adaptação e vulnerabilidade.
Um novo ciclo de relatórios do IPCC deve se iniciar agora em 2016 ou 2017 e, provavelmente, a Coppe novamente deverá se fazer presente, pela participação de seus professores e pesquisadores, seja como autores-coordenadores, autores-líderes ou autores-revisores.
Fonte: COPPE
Campanha #ClimaMuitoLoko explicará, ao longo de 2016 e de forma simples e lúdica, como um estilo sustentável de vida, com a prática do Consumo Consciente, pode contribuir no combate ao Aquecimento Global e suas consequências
No Dia Mundial da Água, 22 de março, o Instituto Akatu lança a campanha #ClimaMuitoLoko, criada para explicar a conexão entre o cotidiano da vida das pessoas com as Mudanças Climáticas e o Consumo Consciente, de forma simples e didática. O combate ao Aquecimento Global exige uma mudança de atitude coletiva – que envolve governos, empresas e cidadãos – e todos precisam entender qual é o papel de cada um neste desafio. Na estreia da campanha, o assunto retratado é a Água, recurso indispensável à vida e que tem seu ciclo ameaçado pelas Mudanças Climáticas. Com a alteração de equilíbrio do clima no planeta, serão mais frequentes eventos extremos como secas e tempestades. Entre os temas que a campanha apresentará ao longo de 2016 estão Energia e Resíduos. Para frear as Mudanças Climáticas, é preciso diminuir as emissões de gases de efeito estufa – que estão aumentando em consequência de atividades humanas como a queima de combustíveis fósseis (petróleo, carvão e derivados) e a produção em escala de alimentos. Ou seja, quando uma pessoa consome sem desperdício produtos de todos os tipos e alimentos, está colaborando na luta contra o Aquecimento Global. Para explicar os vários temas da campanha #ClimaMuitoLoko, serão publicados GIFs nos perfis de redes sociais do Instituto Akatu e artigos especiais no portal www.akatu.org.br. Os conteúdos também serão compartilhados com as empresas apoiadoras e instituições parceiras do Akatu. Nos materiais da campanha, serão divulgadas dicas de como uma pessoa, no seu cotidiano, poderá mudar suas atitudes de forma a diminuir o seu impacto no clima. Ao entender melhor as conexões e contextos apresentados em cada tema, as pessoas poderão reconhecer o quanto suas escolhas de consumo e suas práticas diárias são também essenciais para valorizar e cobrar mudanças de empresas e governos que sigam na mesma direção desse jeito de viver mais sustentável. “É importante que cada pessoa perceba que suas ações, ao longo do tempo, podem ter um impacto positivo sobre o clima”, diz Helio Mattar, diretor-presidente do Instituto Akatu. “A ideia da campanha não é fazer com que elas se sintam ‘culpadas’ pelo Aquecimento Global, mas que percebam que podem contribuir no seu dia a dia de forma positiva para a resolução do problema.” A campanha #ClimaMuitoLoko é uma das atividades previstas para comemorar os 15 anos do Instituto Akatu, completados em 15 de março, data em que também se comemora o Dia Mundial do Consumidor. Ao longo desses anos todos, o Akatu trabalha pela conscientização e mobilização da sociedade para o Consumo Consciente, e assim contribuir para a transição acelerada na direção de estilos sustentáveis de vida, inspirados em uma sociedade do bem-estar e viabilizados por modelos sustentáveis de produção e consumo.
Fonte: Akatu
Quando decorre a Cimeira do Clima e após a queda do governo de coligação PSD-CDS, é importante refletir opções para as políticas públicas que mais se adequam a futuros governos na área da mitigação e adaptação às alterações climáticas. Por João Camargo.
Embora seja uma área relativamente recente e o seu desenvolvimento muito acelerado, este tema tem um impacto tão generalizado que as medidas assumem autênticos programas completos de governo e desígnios quase civilizacionais: do ordenamento do território urbano, florestal e agrícola, ao sistema produtivo industrial, passando pelo comércio nacional e internacional, a produção de energia e todos os transportes. Mais importante, definirá como nos entenderemos de futuro enquanto espécie: em conflito permanente com a natureza ou, pelo contrário, aceitando ser parte da mesma, desenvolvendo sociedades em que os imperativos civilizacionais reconhecem a existência de limites concretos, que não podem ser ultrapassados à base da dinamite e da bala, mas apenas pela inteligência coletiva. Importante rombo em mitos prometeicos, as alterações climáticas devolvem-nos ao materialismo mais puro e objetivo. Os vários futuros cenarizados para a Humanidade têm todos um clima diferente, e em geral muito mais desfavorável do que o atual. O capitalismo e em particular o neoliberalismo manietam a espécie humana de ferramentas cruciais para preparar o planeta e mitigar ao máximo as emissões futuras, ao colocar sempre e em primeiro lugar a contínua expansão da exploração dos recursos e a necessidade de manter taxas de desconto elevadas a curto prazo, para remunerar as transações mercantis à velocidade da luz. A verdade é que o planeta, o metabolismo natural e o metabolismo social não se movimentam à velocidade da luz e a impressão do ritmo das transações financeiras ao sistema ameaça fazê-lo colapsar. O processo social decorrente das alterações climáticas implica à esquerda assumirmos a justiça climática como central: não só são os mais pobres na sociedade que sofrerão o máximo impacto das alterações climáticas como os países que menos contribuíram para a emissão de gases com efeito de estufa são aqueles que terão maiores impactos.
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José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – Devido às mudanças climáticas, a gigantesca circulação de águas, que leva calor do Atlântico Sul para o Atlântico Norte, poderá diminuir quase pela metade ainda neste século. Se isso ocorrer, as consequências serão dramáticas, tanto em escala global quanto, principalmente, nas porções litorâneas dos três continentes banhados pelo Atlântico: América, Europa e África.
Para se ter ideia da importância dessa circulação oceânica, conhecida como Célula de Revolvimento Meridional do Atlântico, basta considerar que sua potência (quantidade de energia liberada por segundo) é quase 100 mil vezes maior do que a da usina hidrelétrica de Itaipu, com todas as turbinas funcionando. A estimativa mais pessimista do IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) é que essa potência, de 1,3 petawatt (1,3 x 1015 W), venha a ser reduzida em 44% até 2100.
Nesse caso, 44% da energia térmica atualmente transportada para as águas frias das altas latitudes do Atlântico Norte ficarão retidas e serão redistribuídas no Atlântico Sul e no Oceano Austral, impactando os centros de alta e baixa pressão, o regime dos ventos, a intensidade e duração das chuvas etc.
Uma forma de aferir a acurácia dessas projeções e desenhar com maior precisão o cenário futuro é olhar para o passado. Isto é, “rodar o modelo para trás” e comparar os resultados obtidos pela simulação com os dados concretos colhidos por meio da pesquisa de campo.
Tal é o propósito do projeto “Resposta da porção oeste do Oceano Atlântico às mudanças na circulação meridional do Atlântico: variabilidade milenar a sazonal”, conduzido pelo paleoclimatólogo Cristiano Mazur Chiessi, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). O projeto é apoiado pela FAPESP por meio do Programa Jovens Pesquisadores.
“Nosso projeto procura avaliar os impactos que as mudanças ocorridas há milhares de anos na circulação oceânica do Atlântico tiveram, na época, sobre o clima da América do Sul e sobre a porção oeste do Atlântico Sul. Um desses impactos, que aconteceu quando a célula teve sua intensidade drasticamente reduzida ou até mesmo colapsou, foi um período prolongado de chuvas torrenciais sobre a região nordeste do atual território brasileiro”, disse Chiessi à Agência FAPESP.
Nas condições atuais, a Célula de Revolvimento Meridional do Atlântico é uma circulação oceânica de larga escala, que recolhe águas quentes de grande salinidade, situadas no topo da coluna de água do Atlântico Sul, e as leva até altas latitudes do Atlântico Norte.
“Ao longo do trajeto, a intensa evaporação, que ocorre nas baixas latitudes, causa um aumento ainda maior da salinidade. Posteriormente, o resfriamento, nas altas latitudes, provoca uma contração de volume. Conjugados, esses dois fatores, aumento de salinidade e contração de volume, tornam as águas mais densas. E a maior densidade faz com que elas afundem na coluna de água e retornem ao Atlântico Sul em camadas profundas e frias, até alcançar as imediações da Antártica”, explicou o pesquisador (veja a animação em www.youtube.com/watch?v=LkRQjTdTvFE).
Em maior detalhe, o processo é o seguinte. A corrente quente desloca-se para norte, próxima do litoral leste da América, desde a altura de Salvador, no Brasil, até a altura de Nova York, nos Estados Unidos, aproximadamente. Lá, sofre uma inflexão para leste, rumo à Islândia e à Noruega. E, depois de alcançar o norte europeu, retorna ao sul, já como corrente fria e profunda, fluindo paralela à margem leste da América, até chegar às imediações da Antártica.
A grande perda de calor para o meio, que faz a corrente afundar, ocorre em dois sítios específicos: o Mar de Labrador, entre o Canadá e a Groenlândia, e o Mar da Noruega, entre a Groenlândia, a Islândia e a Noruega. “Devido a essa liberação de calor, a temperatura média da superfície oceânica perto do sul da Noruega ou do norte da Inglaterra é muito mais alta do que na porção da costa canadense situada na mesma latitude”, informou Chiessi.
A célula exerce uma influência muito grande sobre o clima, não apenas do oceano, mas também de todos os continentes situados ao redor do Atlântico “Isso vale especialmente para as porções desses continentes banhadas pelo oceano. Na América do Sul, tudo o que está a leste da Cordilheira dos Andes é altamente influenciado pelo fenômeno”, acrescentou o pesquisador.
Ele acredita que, em função das mudanças climáticas, a diminuição da intensidade desse processo oceânico já esteja acontecendo.
“O aquecimento global arrefece a circulação de duas maneiras. Em primeiro lugar, por uma intensificação das chuvas nas altas latitudes do Atlântico Norte, exatamente nos locais em que as águas precisam de maior densidade para poder afundar e retornar ao Sul. Se chove muito nessas regiões, a salinidade das águas superficiais diminui, reduzindo, por consequência, sua densidade e dificultando o afundamento. Em segundo lugar, pelo derretimento da calota de gelo sobre a Groenlândia, liberando água doce, de salinidade extremamente baixa, exatamente nos sítios de formação das águas profundas”, afirmou.
Chuvas torrenciais e prolongadas no Nordeste
Segundo o pesquisador, existe ainda uma grande margem de incerteza nas projeções. Os modelos atuais funcionariam muito bem para algumas variáveis. Mas não tão bem para outras. Daí a proposta de investigar, no passado, períodos em que a circulação esteve bastante diminuída ou até mesmo colapsada, para identificar quais foram as consequências, especialmente na margem oeste do Atlântico Sul.
“O período icônico mais recente de redução da circulação oceânica ocorreu entre 18 mil e 15 mil anos antes do presente, na última grande deglaciação. Com o aquecimento do planeta, as geleiras existentes nas altas latitudes do Hemisfério Norte, especialmente sobre o território canadense, derreteram e lançaram uma enorme quantidade de água doce no Mar de Labrador, arrefecendo ou até paralisando a Célula de Revolvimento Meridional do Atlântico”, relatou Chiessi.
Para estimar a magnitude do degelo, é preciso recuar mais um milênio, até 19 mil anos antes do presente. Nessa época, no máximo glacial, a concentração de CO2 na atmosfera, atualmente maior do que 400 partes por milhão (ppm), estava muito baixa, na faixa de 175 ppm. E o nível do mar encontrava-se 130 metros abaixo do atual. Toda a água correspondente permanecia aprisionada nas geleiras continentais, principalmente sobre o Canadá e o norte dos Estados Unidos.
Em várias regiões do planeta, a linha da costa havia avançado centenas de quilômetros sobre a área hoje ocupada pelos oceanos. Era possível ir a pé das Ilhas Malvinas ao atual território da Argentina; do sul da Inglaterra à França; do nordeste da Ásia ao noroeste da América do Norte. Não havia o Canal da Mancha, nem o Estreito de Bering, pois estas regiões encontravam-se emersas.
“Entre 18 mil e 15 mil anos atrás, com o aquecimento, as geleiras começaram a lançar uma extraordinária quantidade de icebergs no Mar de Labrador, diminuindo a salinidade das águas superficiais e, portanto, a intensidade da Célula de Revolvimento. Acredita-se mesmo que possa ter havido um colapso total da circulação. A potência de 1,3 petawatt de calor teve que ser redistribuída ao redor do Atlântico Sul e do Oceano Austral. E chegou a aquecer expressivamente a Antártica”, informou o pesquisador.
Devido a isso, a chamada zona de convergência intertropical, localizada onde a superfície do oceano é mais quente, e, consequentemente, a evaporação e a concentração de nuvens alcançam os valores mais altos, deslocou-se para o sul. Hoje, ela está situada em média entre 5 e 10 graus ao norte da linha equatorial. Naquela época, migrou para o sul do Equador, provocando chuvas torrenciais e prolongadas sobre o nordeste do território brasileiro.
“Um de nossos trabalhos, publicado em Earth and Planetary Science Letters no ano passado, evidenciou tal fenômeno”, disse Chiessi, referindo-se ao artigo Origin of increased terrigenous supply to the NE South American continental margin during Heinrich Stadial 1 and the Younger Dryas.
A pesquisa constatou um colossal aumento da taxa de sedimentação no fundo oceânico, em decorrência da erosão causada pelas chuvas e do arraste de sedimentos pelos rios, mar adentro. À frente da foz do rio Parnaíba, no Piauí, mas já em alto-mar, a mais de um quilômetro de profundidade, a taxa de sedimentação alcançou o valor de 100 centímetros em mil anos. Este é o padrão de sedimentação do Amazonas, que é um rio gigantesco. No entanto, foi igualado pelo Parnaíba, um rio de porte incomparavelmente menor.
“Devido às chuvas que incidiram sobre o Nordeste, o Parnaíba depositou em alguns locais uma quantidade de sedimentos equivalente àquela depositada pelo Amazonas. No mesmo período, há registros de uma grande diminuição das precipitações ao norte, na Venezuela e na América Central”, comentou Chiessi.
“Nós coletamos e analisamos entre oito e nove metros de coluna sedimentar em dois sítios marinhos: um deles ao largo da desembocadura do Parnaíba, o outro ao largo da Guiana Francesa. O primeiro foi coletado a 1.367 metros de profundidade. O segundo, a 2.510 metros”, detalhou.
Conforme descreveu o pesquisador, o processo de coleta é o seguinte. Primeiro, com o emprego de ecossonda de penetração, é feita a imagem do subfundo oceânico. Isso informa como estão as camadas sedimentares, se existem ou não distúrbios de sedimentação. Em regiões onde não há distúrbios, é enviado, então, do navio para baixo, um equipamento com mais de 5 toneladas chamado “testemunhador a gravidade”.
Por gravidade, o “testemunhador” chega ao fundo oceânico e penetra suavemente na camada de sedimentos não consolidada, recolhendo, sem distúrbios, de oito a dez metros de coluna sedimentar. Depois, já no laboratório, cada fração da coluna é analisada, obtendo-se, a partir disso, miríades de informações.
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