Pesquisadores estão indo a campo por conta própria para coletar amostras, resgatar animais e analisar o verdadeiro impacto ambiental do tsunami de lama que varreu a bacia do Rio Doce
Centenas de cientistas brasileiros estão se organizando, voluntariamente, para fazer uma avaliação independente do impacto ambiental causado pelo rompimento das barragens de Mariana. Muitos deles se deslocaram para os locais atingidos pelo desastre e estão coletando dados e amostras para análise, num esforço que lembra o de médicos voluntários ajudando vítimas de um terremoto (neste caso, um tsunami de lama). Um grupo foi criado no Facebook para organizar os esforços e uma iniciativa de crowdfunding foi lançada para financiar as análises e a elaboração do relatório: http://goo.gl/1xEPnj
“Considerando que este é um dos maiores desastres ambientais sofrido pelo Brasil, envolvendo rios e as populações a sua volta, abrangendo vários municípios, que as posturas das instituições públicas são vagas e o poder econômico dos envolvidos, é de extrema importância que exista um relatório independente e isento, que possa ser utilizado nas ações decorrentes relacionadas aos efeitos do rompimento das barragens”, diz a proposta de crowdfunding na internet, que visa a arrecadar R$ 50 mil. “O relatório final será de domínio público, constituindo-se em ferramenta para que este desastre não fique impune.”
A iniciativa partiu do biólogo Dante Pavan, especialista em répteis e anfíbios formado pelo Instituto de Biociências da USP, e está sendo coordenada por Viviane Schuch, microbióloga e pesquisadora da Unifesp.
Um grupo criado no Facebook para compartilhar informações e notícias sobre o desastre tinha mais de 3 mil membros na segunda-feira (16) de manhã:https://m.facebook.com/giaia2015. (OBS: Nem todos são pesquisadores. Com a divulgação da notícia, muita gente interessada no assunto se inscreveu no grupo.)*
“Muitos profissionais estão neste momento em campo com recursos próprios. Através do Facebook, houve a organização das equipes, de forma a se otimizar as coletas de amostras de água e sedimentos. Algumas coletas foram realizadas antes da chegada da lama, e outras estão sendo feitas agora, após a chegada. Nosso objetivo é conseguir parcerias com laboratórios para que sejam feitas análises de metais pesados, poluentes e de metagenômica. Muitos laboratórios de dentro e de fora do Brasil já demonstraram interesse, até porque existe um claro apelo científico”, disse ao Estado o biólogo Alexandre Martensen, que não foi ao local do desastre mas participa da iniciativa online, na Universidade de Toronto, onde está fazendo seu doutorado.
“Contrastando com a relativa inércia das empresas envolvidas e também das diferentes instâncias de governo, este grupo independente rapidamente se mobilizou via rede social e começou uma impressionante ação, que pode ter um papel fundamental para que saibamos algum dia os reais impactos deste acidente, bem como possamos recuperar esta bacia”, completou Martensen, que tem experiência na realização de estudos de impacto ambiental.
Os relatos daqueles que estão no campo são de um cenário de destruição generalizada, que deixará impactos de longo prazo por toda a bacia do Rio Doce. Muitos rios por onde a onda de lama passou foram totalmente soterrados ou severamente assoreados, comprometendo a vida de todo o ecossistema, e os impactos deverão chegar ao ambiente marinho. Os pesquisadores foram rápidos e conseguiram chegar à foz do Rio Doce antes da lama, a tempo de coletar amostras de água, areia e outros sedimentos no seu “estado natural”, que depois servirão de base comparativa para avaliar os estragos e a contaminação gerados pelo desastre.
Fonte: Estadão
André Ruschi denuncia “assassinato da 5ª maior bacia hidrográfica brasileira”, diz que Samarco precisa ser fechada e critica uso do mar para dispersão da poluição
Por Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)
O biólogo André Ruschi, diretor da escola Estação Biologia Marinha Augusto Ruschi, em Aracruz (ES), defende o fechamento da Samarco, mineradora responsável pelo rompimento da barragem de resíduos em Mariana (MG). Ele usou uma rede social para falar do impacto em três Unidades de Conservação, em particular o Refúgio de Vida Silvestre de Santa Cruz, um dos mais importantes criadouros marinhos do Oceano Atlântico.
“O fluxo de nutrientes de toda a cadeia alimentar de 1/3 da região sudeste e o eixo de ½ do Oceano Atlântico Sul está comprometido e pouco funcional por no mínimo 100 anos”, afirma. Ele aponta “assassinato da quinta maior bacia hidrográfica brasileira”, diz que a empresa é reincidente e debochou da prevenção.
Ele também critica o licenciamento para o projeto: “Barragens e lagoas de contenção de dejetos necessitam ter barragens de emergência e plano de contingência. Como licenciar o projeto sem estes quesitos cumpridos?”
Em outra publicação ele fala sobre o “mar de lama” que se tornou a enxurrada de resíduos da Samarco: “Não seria melhor evitar que a lama chegasse ao mar?
Quem teve a brilhante ideia de abrir as comportas das barragens rio abaixo em vez de fechá-las para conter a lama e depois retirar a lama da calha do rio? Quem ainda pensa que o mar tem o poder de diluição da poluição? Isto é um retrocesso da ciência de mais de um século!”
Vejam o depoimento inicial dele, conforme publicado em sua página no Facebook:
“Esta sopa de lama tóxica que desce no rio Doce e descerá por alguns anos toda vez que houver chuvas fortes e irá para a região litorânea do ES, espalhando-se por uns 3.000 km2 no litoral norte e uns 7.000 km2 no litoral ao sul, atingindo três Unidades de Conservação marinhas – Comboios, APA Costa das Algas e RVS de Santa Cruz, que juntos somam uns 200.000 km no mar.
Os minerais mais tóxicos e que estão em pequenas quantidades na massa total da lama, aparecerão concentrados na cadeia alimentar por muitos anos, talvez uns 100 anos.
RVS de Santa Cruz é um dos mais importantes criadouros marinhos do Oceano Atlântico.
Um hectare de criadouro marinho equivale a 100 quilômetros de floresta tropical primária. Isto significa que o impacto no mar equivale a uma descarga tóxica que contaminaria uma área terrestre de de 20 milhões de hectares ou 200 mil km2 de floresta tropical primária. E a mata ciliar também tem valor em dobro.
Considerando as duas margens, são 1.500 km lineares x 2 = 3.000 km2 ou 300 mil hectares de floresta tropical primária.
Vocês não fazem ideia.
O fluxo de nutrientes de toda a cadeia alimentar de 1/3 da região sudeste e o eixo de ½ do Oceano Atlântico Sul está comprometido e pouco funcional por no mínimo 100 anos!
Conclusão: esta empresa tem que fechar.
Além de pagar pelo assassinato da 5ª maior bacia hidrográfica brasileira. Eles debocharam da prevenção e são reincidentes em diversos casos. Demonstram incapacidade de operação crassa e com consequências trágicas e incomensuráveis. Como não fechar? Representam perigo para a segurança da nação!
O que restava de biodiversidade castigada pela seca agora terminou de ir. Quem sobreviverá? Quais espécies de peixes, anfíbios, moluscos, anelídeos, insetos aquáticos jamais serão vistas novamente? A lista de espécies desaparecidas foram quantas? Se alguém tiver informações, ajudariam a pensar.
Barragens e lagoas de contenção de dejetos necessitam ter barragens de emergência e plano de contingência. Como licenciar o projeto sem estes quesitos cumpridos? Qual a legalidade da licença para operação sem a garantia de segurança para a sociedade e o meio ambiente?
Sendo Rio Federal a jurisdição é do governo federal, portanto os encaminhamentos devem serem feitos ao Ministério Público Federal”.
Fonte: Blog do Alceu Castilho
Em seis dias, a lama da barragem da mineradora Samarco deve chegar à foz do Rio Doce e desembocar no oceano. Até lá, os resíduos da barragem que rompeu na última quinta-feira (05), em Mariana (MG), deverão impactar três unidades de conservação marinha: a Reserva Biológica (Rebio) de Comboios, a Área de Proteção Ambiental (APA) Costa das Algas e a Reserva de Vida Silvestre (RVS) de Santa Cruz, todas localizadas no Espírito Santo.
O rompimento da barragem destruiu o distrito de Bento Rodrigues, na região central de Minas, onde viviam cerca de 600 pessoas, e deixou uma mancha de destruição no meio do caminho: já são 8 pessoas mortas e 26 desaparecidas. Os impactos ambientais ainda estão sendo calculados ao longo da extensão por onde passa a lama.
A equipe de analistas ambientais da Rebio de Comboios, localizada nos municípios de Linhares e Aracruz, no Espírito Santo, está colhendo amostras da água junto com pesquisadores da Universidade Vila Velha (UVV), que fará a análise do material. Por enquanto, a mancha ainda não chegou na unidade. “Queremos fazer um retrato da situação antes e depois do evento. O objetivo original é analisar a presença de metais pesados no segmento e na fauna e fazer a comparação de antes e depois”, afirma Antonio de Pádua Almeida, conhecido como Toninho, gestor da Reserva.
Tamar retira ovos
O Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Tartarugas Marinhas (Tamar), do Instituto Chico Mendes, removeu cerca de 22 ninhos da espécie em Vila de Regência, no Espírito Santo.
O objetivo é proteger os ninhos mais próximos da foz e evitar a contaminação das tartarugas pelos resíduos tóxicos vindos da barragem. A foz do rio Doce, é uma importante área de concentração de desovas da tartaruga-gigante (Dermochelys coriacea).
“[Os ninhos] foram transferidos para uma área segura, como proteção a uma possível lama contaminada ou mesmo a uma erosão acentuada aqui da foz”, explica o coordenador nacional do Projeto Tamar, João Carlos Joca Thomé.
Em seis dias, a lama da barragem da mineradora Samarco deve chegar à foz do Rio Doce e desembocar no oceano. Até lá, os resíduos da barragem que rompeu na última quinta-feira (05), em Mariana (MG), deverão impactar três unidades de conservação marinha: a Reserva Biológica (Rebio) de Comboios, a Área de Proteção Ambiental (APA) Costa das Algas e a Reserva de Vida Silvestre (RVS) de Santa Cruz, todas localizadas no Espírito Santo.
O rompimento da barragem destruiu o distrito de Bento Rodrigues, na região central de Minas, onde viviam cerca de 600 pessoas, e deixou uma mancha de destruição no meio do caminho: já são 8 pessoas mortas e 26 desaparecidas. Os impactos ambientais ainda estão sendo calculados ao longo da extensão por onde passa a lama.
A equipe de analistas ambientais da Rebio de Comboios, localizada nos municípios de Linhares e Aracruz, no Espírito Santo, está colhendo amostras da água junto com pesquisadores da Universidade Vila Velha (UVV), que fará a análise do material. Por enquanto, a mancha ainda não chegou na unidade. “Queremos fazer um retrato da situação antes e depois do evento. O objetivo original é analisar a presença de metais pesados no segmento e na fauna e fazer a comparação de antes e depois”, afirma Antonio de Pádua Almeida, conhecido como Toninho, gestor da Reserva.
Tamar retira ovos
O Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Tartarugas Marinhas (Tamar), do Instituto Chico Mendes, removeu cerca de 22 ninhos da espécie em Vila de Regência, no Espírito Santo.
O objetivo é proteger os ninhos mais próximos da foz e evitar a contaminação das tartarugas pelos resíduos tóxicos vindos da barragem. A foz do rio Doce, é uma importante área de concentração de desovas da tartaruga-gigante (Dermochelys coriacea).
“[Os ninhos] foram transferidos para uma área segura, como proteção a uma possível lama contaminada ou mesmo a uma erosão acentuada aqui da foz”, explica o coordenador nacional do Projeto Tamar, João Carlos Joca Thomé.
Mas o principal trabalho que está sendo realizado no momento é a construção de uma espécie de “desvio” para que a lama não atinja a área de restinga e vá direto para o oceano. O projeto está sendo realizado pela Prefeitura de Linhares com o apoio do Tamar. A Prefeitura está abrindo uma canal medindo entre 70 e 80 metros para escoar a água suja até o mar.
“O trabalho que fazemos aqui nesse momento é uma preparação da boca da barra que estava fechada para a navegação por conta da seca. Nós estamos preparando a boca da barra aqui, junto com a Associação de Moradores, Prefeitura e Estado, para que, caso chegue essa água contaminada, ela flua pro mar, e não contamine o estuário, a zona mais sensível”, afirma João Carlos Joca Thomé.
Fonte: O Eco
Para Andrea Santos, secretária executiva do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, as iniciativas subnacionais, que levam em conta o potencial e as vulnerabilidades locais, são essenciais para promover um futuro sustentável. Não basta, portanto, a implementação de leis globais, iguais para todos os países
Apesar de as negociações internacionais serem importantes para incentivar os países a se comprometer com metas sustentáveis, a bióloga baiana Andrea Santos, secretária executiva do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, aposta que seria melhor ter planos locais, adequados à realidade de cada cidade, para enfrentar as mudanças climáticas. Ou seja, seria mais eficiente ter regras para cada município, do que somente metas globais, iguais para todos.
Andrea também defende que o governo deveria ter levado o diálogo com a sociedade civil em consideração para estabelecer a INDC (na sigla em inglês, "contribuição pretendida nacionalmente determinada"), apresentadas em setembro, em vez de ditar normas de cima para baixo. Mas ressalta que também cabe aos representantes das cidades serem mais proativos ao propor sugestões e programas sustentáveis. Veja abaixo a entrevista completa.
Qual é o papel das cidades na mitigação das mudanças climáticas? O Brasil é um país urbano, com 80% da população vivendo nessa situação. Desde a queda acentuada do desmatamento, o perfil das emissões de gases de efeito estufa está mudando, e os principais responsáveis por esse mal passaram a ser as indústrias de energia e transporte. Por isso, as soluções para lidar com as mudanças climáticas estão justamente nas iniciativas pontuais e individuais de cada município, com maior potencial de impactar esses dois setores de produção. As formas de se chegar a essa meta são diversas, como pela inovação tecnológica, o investimento em energias alternativas e a melhora da infraestrutura do transporte público.
Então, as discussões climáticas no âmbito internacional são inúteis? Não é isso. Na esfera internacional, o objetivo é chegar a um acordo global, que, com esperança, deve ser assinado na Cúpula do Clima (COP) que acontece em dezembro em Paris. A função disso seria, portanto, estimular os países a se compromissar com metas nacionais. Na escala federal, as nações devem promover a articulação interna entre os projetos regionais, um desafio imenso em um país continental como o Brasil. O governo federal também tem a competência de lançar planos nacionais e, claro, ajudar a financiar projetos locais. Já os estados e municípios precisam conhecer o problema, as metas, e a sua vulnerabilidade, para estudar quais são as melhores estratégias regionais para cooperar com o objetivo de controlar o clima.
Já há bons exemplos de iniciativas nesse sentido? Alguns estados, estrangeiros ou nacionais, têm experiências interessantes. A Califórnia, por exemplo, adotou metas de redução de emissões próprias. Na Alemanha, várias cidades têm programas locais de incentivo à energia fotovoltaica. Aqui no Brasil, eu participo do projeto Fundo Verde, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que quer transformar o próprio campus em exemplo de sustentabilidade. O programa é resultado de uma articulação entre a academia, o governo e a da empresa de gereção de energia limpa Light Energia. Criou-se um ICMS para todas as contas de eletricidade da universidade, o que acaba rendendo até 1 milhão de reais por mês. Com esse dinheiro, promovemos ações de eficiência energética, uso de água e mobilidade sustentável. Outro bom exemplo a meu ver, são as ciclovias paulistanas.
Para elaborar as metas do INDC, o governou diz ter consultado diversos setores da sociedade, incluindo aí as prefeituras. Isso não aconteceu? A ideia é bonita no conceito, e de fato essa consulta foi feita, pelo menos do ponto de vista burocrático, mas a questão é até onde esses comentários foram considerados para estabelecer os objetivos. Eu posso afirmar, infelizmente, que a INDC foi elaborada por um grupo pequeno do governo federal, com base nos dados técnicos e no interesse politico do Brasil. Sem presença real de governos locais, nem de instituições ativas de estudo acadêmico.
São os governos municipais que não querem participar? Há menos interesse do que gostaríamos, é verdade. Atualmente, a ação vem muito de cima para baixo, com o governo federal ditando para os estados e municípios o que deve ser feito. Só aqueles que são proativos se engajam, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, que têm metas de redução próprias. Mas de nada adianta cada lugar fazer um plano individual de mitigação com métodos diferentes, que não possam a ser contabilizados e analisados em conjunto. Está aí a importância do papel de articulador do governo federal. As cidades também precisam começar a participar da ação em termos práticos, com subsídios para fontes de energia renovável e investimento no transporte público.
Olhando para as cidades, qual é o papel do poder público, da sociedade civil e da iniciativa privada? A iniciativa privada deve identificar oportunidades de investimentos em tecnologia verde que serão lucrativas a longo prazo. Também é importante lembrar que, quando existem políticas que obrigam a indústria a reduzir as emissões de gases de efeito estufa, as empresas que não seguem as diretrizes perdem a competitividade. Já à sociedade civil cabe o importante papel de propor ideias, cobrar iniciativas e tornar o diálogo dinâmico. O governo, por fim, deve atuar no plano de ação das políticas públicas, buscando articular projetos e promover o incentivo fiscal.
Se o potencial de mitigação das cidades fosse analisado individualmente e levado em conta, as metas brasileiras seriam mais ambiciosas? Para criar essas metas, o governo federal contabilizou o potencial setorial de cada área, como transporte e indústria. Há, contudo, ações que já existem e muitas vezes não são incorporadas ao cálculo. Se promovêssemos essa discussão estabelecendo uma metodologia padrão e levando em conta os projetos em curso, os números já deveriam ser melhores.
Fonte: VEJA