Brasil divulgará em breve as metas para a COP 21: dicas para a cobertura

O Brasil tem até o dia 1o de outubro para tornar públicos os compromissos que pretende assumir para reduzir suas emissões de gases que provocam o efeito estufa dentro de um novo acordo global para conter as mudanças climáticas após 2020. Em reunião recente com a chanceler alemã Angela Merkel, a presidente Dilma Rousseff indicou que as metas serão divulgadas na conferência da ONU para adoção dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que ocorrerá de 25 a 27 de setembro em Nova Iorque.

Dos 194 países que se reúnem em Paris a partir do dia 30 de novembro na 21a Conferência das Partes (COP 21) para fechar as bases do acordo que vai substituir o Protocolo de Kyoto, 34 propostas com metas já foram enviadas, estas incluem a maioria dos países desenvolvidos e também dos maiores emissores. Essas propostas são chamadas de Contribuições Pretendidas Nacionalmente Determinadas (INDC, da sigla em inglês).

Devido à complexidade do tema, o projeto Mídia e Amazônia faz alguns esclarecimentos para ajudar na cobertura do tema que irá dominar o noticiário até dezembro: a COP 21. A cobertura começa a ter destaque a partir da divulgação da INDC brasileira, que deve ocorrer em breve. Outra data importante será 1o de novembro, quando será divulgado o documento-síntese com todos os planos nacionais (INDCs).

Na COP 20 em Lima, ficou estabelecido que os países desenvolvidos divulgariam suas INDCs em março e os outros até junho, dando mais tempo para que fossem reunidas em um único documento.

Apesar do atraso, há muito mais otimismo agora do que havia antes da fracassada COP 15 de Copenhague, em 2009, quando os membros da Convenção-Quadro das Nações Unidas para Mudanças Climáticas (Convenção do Clima ou UNFCCC, da sigla em inglês) não conseguiram chegar a um acordo. Há mais engajamento dos governos (inclusive de grandes emissores, como China, EUA e União Europeia, preocupados com os efeitos das mudanças climáticas que já influem na economia), há mais pressão não só da sociedade civil, mas também do setor privado, que quer regras claras para o futuro e, principalmente, porque desta vez o acordo será construído em etapas. A primeira fase, a COP de Paris, vai definir os compromissos para um período após 2020.

Como objetivo final é impedir que a temperatura do planeta suba mais de 2ºC em relação ao período pré-industrial, um limite considerado seguro pela ciência do clima1, outros acordos internacionais com horizontes de tempo até 2050 e até o final do século vão se seguir.

Se não houver redução na emissão de Gases de Efeito Estufa (GEEs), caminhamos para um aumento de 4ºC a 6ºC na temperatura da superfície terrestre no final deste século. De acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças do Clima (IPCC), as emissões têm que cair dramaticamente no meio do século e chegar perto de zero em 20702.

Segundo Christiana Figueres, secretária-executiva da UNFCCC, “o propósito da Convenção é quebrar a ligação entre crescimento do PIB global e aumento de emissões de gases de efeito estufa, que existe há 150 anos”. Isso já está acontecendo em países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Ela lembra que já há um texto de negociação, ainda muito extenso, mas é um texto inicial que não existia em Copenhague. E frisa que o total das INDCs somadas “não vão nos colocar no caminho do limite de 2ºC”. Figueres vem repetindo que isso não vai acontecer nesse primeiro momento. A lacuna vai ser resolvida no longo prazo.

Para explicar a dinâmica dos acordos, a secretária-executiva da UNFCCC usa a metáfora de uma rodovia: todos os 149 países concordam em pegar a estrada e seguem paralelamente em velocidades diferentes, nas faixas que escolherem, mas na mesma direção. Esse seria o ponto de partida e o resultado do acordo em Paris. Os compromissos seriam então revistos e ampliados com o tempo. Ela admite que o desafio é ainda maior para os países em desenvolvimento, já que ninguém antes alcançou crescimento econômico sem aumentar emissões de carbono.

Brasil e América Latina

Na América Latina, até agora, México e Chile foram os únicos que apresentaram suas propostas, e o Brasil está na reta final para divulgar sua INDC. Elas são públicas, mas difíceis de interpretar. Já existem duas plataformas de análise das INDCs em inglês que avaliam, inclusive, quem está apresentando boas propostas e quem está maquiando números. A do World Resources Institute (WRI), um instituto global de pesquisa, e a do Climate Action Tracker, um consórcio de quatro instituições ligadas ao clima.

No Brasil, o Observatório do Clima (OC), formado por 35 instituições da sociedade civil, tem acompanhado o processo de perto e lançou sua proposta do que seria uma INDC ideal. OC e Greenpeace consideraram o anúncio conjunto da presidente Dilma Rousseff e do presidente Barack Obama nos EUA em junho muito tímido. Dilma adiantou que o país vai se comprometer a recuperar 12 milhões de hectares de florestas até 2030.  Também foi anunciado pela presidente brasileira que o desmatamento ilegal zero será atingido nesta data e que, até lá, 28% a 33% de sua matriz energética será de energias renováveis.

Convém ao jornalista ficar atento a essas metas. A atenção deve ser especial no caso do desmatamento em função de compromissos anteriores  e  quanto à matriz energética brasileira, de base hidrelétrica em sua maioria, mas complementada por usinas termoelétricas que alteram o cálculo de emissões. A soma das propostas de todos os países vai mostrar se são ambiciosas o suficiente para estabilizar o aquecimento global em níveis seguros. As do Brasil vão mostrar se o país será capaz de liderar mais uma vez, usando seu grande potencial de crescer com sustentabilidade.

Uma das novidades no cenário brasileiro, a Coalizão Brasil – Clima, Floresta e Agricultura reúne sociedade civil e agronegócio para pressionar o governo a assumir uma INDC ambiciosa. Ela também lançou um documento com 17 propostas para balizar a posição brasileira na COP. Um dos coordenadores da Coalizão, Roberto Waack, presidente da AMATA, empresa que trabalha com madeira certificada, e ligado à área florestal, explica que a discussão do clima sempre foi muito hermética e estava dividida em duas frentes: Itamaraty, onde era muito técnica, e ONGs, que muitas vezes misturam questões técnicas com ativismo.

A conjunção de esforços do setor privado ligado ao uso da terra, que representa 25% do PIB brasileiro, com sociedade civil partiu do consenso de que o Brasil é um dos poucos países que podem reduzir emissões ligadas à agricultura e uso da terra e ainda assim ser um grande produtor e exportador de alimentos e commodities. Pode dobrar a produção sem desmatar e ainda reduzir as emissões de forma ambiciosa, como o planeta precisa.

Waack também aponta o diálogo construtivo entre o Ministério do Meio Ambiente, o Ministério da Agricultura e o Ministério da Fazenda na construção do consenso em torno da INDC brasileira. Ele estava presente na reunião do último dia 11 para discutir a questão de florestas na INDC brasileira e ressalta o engajamento dos técnicos do Ministério da Fazenda e o envolvimento no tema do ministro da Economia, Joaquim Levy. “Isto é novo e importante para a construção de políticas públicas consistentes”.

Aos poucos, a discussão do clima vai saindo das páginas de ciência e ganhando espaço nas de economia, política, agronegócio e finanças. E os jornalistas precisam ficar atentos para poderem divulgar as metas brasileiras, não de forma isolada, mas sim contextualizada, permitindo ao leitor uma real avaliação do grau de ambição das metas do governo brasileiro.

Fonte: Mídia e Amazônia

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