Estudo prevê menos chuva no Norte e períodos de seca no Sul do país

Mudanças são acompanhadas de perto por setores estratégicos da economia: energia e agricultura. ‘Temos que estar preparados’, alerta climatologista.

Cientistas que estudam as mudanças do clima, dizem que a estiagem que São Paulo está enfrentando não é um fenômeno isolado. E que, daqui para frente, os chamados eventos extremos vão provocar mais tempestades e mais períodos de seca do que o normal.

Na primeira reportagem da série sobre água, que o Jornal Nacional mostra a partir desta segunda-feira (24), o repórter André Trigueiro mostra como o clima já mudou.

O volume de água que cai do céu continua o mesmo. Mas a distribuição das chuvas no Brasil está mudando.

"Os extremos climáticos estão ficando mais frequentes no Brasil. Tem região que tá chovendo muito do lado de uma região que está enfrentando uma seca muito grande”, afirma Carlos Nobre, climatologista / Ministério da Ciência e Tecnologia.

A região metropolitana de São Paulo é o lugar do país onde a mudança climática foi mais intensa. Aquela que já foi a terra da garoa, hoje é uma chapa quente. E a culpa não é só do aquecimento global.

A multiplicação de áreas cobertas por asfalto, concreto e cimento e a diminuição do verde mudaram os padrões de umidade e de evaporação.

Temperatura média de SP subiu 2,5°C

"A cidade de São Paulo é uma redoma quente. Sem vegetação, o concreto absorve muita radiação, mas não tem muita água para evaporar. Então, ele aquece o ar. Por isso que é uma cidade é bem mais quente", explica Carlos Nobre.

Nos últimos 70 anos, a temperatura média em São Paulo já subiu 2,5°C. E a população sofre com os extremos climáticos. Tempestades mais rápidas e violentas, contrastando com períodos de seca e calor intenso.

“Então muitas vezes uma chuva que vem, fica em São Paulo, solta toda essa chuva aí e não vai nas áreas que realmente deveria precisar", diz Antônio Marengo, climatologista - Cemaden.

Parte da chuva que cai em São Paulo vem de longe. Mais precisamente da Amazônia. A cada dia, a floresta produz 20 bilhões de toneladas de água em forma de vapor. Esse vapor que sai das árvores é transportado pelos ventos em direção ao sul. Quanto menos árvores na região Norte, menos chuvas na parte debaixo do continente.

“Nós temos que estar preparados para não ser mais pegos de surpresa com esses extremos. Porque eu não sei quando, mas eles vão se repetir: um extremo de muita chuva ou um extremo de seca”, afirma o meteorologista do Inmet Lúcio de Souza.

O mais importante estudo já feito sobre a mudança do clima no Brasil prevê que até o fim deste século haverá menos chuva nas regiões Norte e Nordeste. Estiagens mais longas na região Centro-Oeste. E chuvas mais intensas intercaladas por períodos de seca nas regiões Sudeste e Sul.

JN obtém informações de estudo inédito sobre o risco de perdas nas lavouras

Essas mudanças estão sendo acompanhadas de perto por dois setores estratégicos da economia: energia, que depende da água estocada nos reservatórios e da vazão dos rios; e agricultura, que precisa de chuva para irrigar as lavouras.

Para o pesquisador da Embrapa Eduardo Delgado Assad, é preciso correr contra o tempo.

"O que nos chamou atenção é que o cenário que nós havíamos previsto para 2020 antecipou já para 2014. Nós perdemos em 2014 R$ 10 bilhões em perdas por queda de produtividade de veranicos muito fortes", conta o pesquisador Embrapa Eduardo Delgado Assad.

O Jornal Nacional obteve com exclusividade as informações de um estudo inédito da Embrapa sobre o risco de perdas nas lavouras se nada for feito: até 2050, queda 12% na produção de milho; 16% na de trigo; e de 60% na produção de soja, principal produto do agronegócio.

Mas para enfrentar as mudanças no tempo, cientistas brasileiros desenvolveram uma nova geração de plantas que crescem com menos água. A catuí vermelho é uma planta extremamente resistente à falta de chuva. É de onde vem boa parte do cafezinho que os brasileiros bebem todos os dias. Há seis anos, cientistas da Embrapa vem realizando testes retirando da planta o gene responsável pela maior tolerância à falta de água dessa planta e inserindo em outras culturas, como a soja. Os grãos que foram modificados, por exemplo, já não precisam de tanta água para crescer.

"As plantas não modificadas com 15 dias morriam. Quinze dias de seca. E as plantas que receberam gene de café, até 40 dias elas sobreviviam", explica o coordenador do projeto da Embrapa Eduardo Romano.

Um pé de feijão estava há cinco dias sem água, o suficiente para que as folhas ficassem caídas, murchas. E uma outra espécie recebeu o gene de levedura, fungo usado na fabricação de cerveja e pães, e ficou inteira, com as folhas viçosas. Podendo permanecer assim por mais 15 dias sem murchar.

Será que vai chover? Está cada vez mais difícil responder a essa pergunta. Em um país que depende tanto de chuva, é preciso estar preparado para qualquer resposta.

Fonte: Portal G1

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