Painel Brasileiro do Clima prevê mais seca

Primeira análise nacional sobre o impacto das mudanças climáticas indica que Amazônia e caatinga são os biomas mais vulneráveis até o fim do século

RIO — Enquanto os chefes de Estado reunidos na Rio+20 não parecem dispostos a assinar um documento mais ambicioso do que o já acordado, o Primeiro Relatório de Avaliação Nacional de Mudanças Climáticas prevê um Brasil ainda mais vulnerável ao aumento da temperatura do planeta do que o imaginado. O documento, organizado pela Coppe/UFRJ, reúne dados de 128 cientistas de todo o país. E estima que, ao longo do século, as secas serão cada vez mais severas na Amazônia e na caatinga, com redução de chuvas bem acima da média. Os grandes centros urbanos do Sudeste enfrentariam um aumento constante da intensidade de tempestades.

A Amazônia, segundo o estu$, é o mais vulnerável dos biomas. Os números mostram que, até 2100, as mudanças seriam consideráveis. A previsão é que o clima local ficaria muito mais seco que o atual, com redução de até 45% das chuvas, e mais quente, com aumento de temperatura variando de 5°C a 6°C — compatível com os piores cenários produzidos pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU. O levantamento revela, no entanto, que o problema não está tão distante quanto parece. Os primeiros efeitos já seriam sentidos nos próximos 30 anos, quando as chuvas poderão ser reduzidas em 10%.

 Na caatinga, a situação seria semelhante, indicando que as recentes secas registradas no Nordeste devem estar incluídas num contexto maior de mudanças climáticas. Nas próximas três décadas, as chuvas seriam reduzidas em até 20% nessa área já tão árida. Esse percentual de queda poderia chegar a alarmantes 50% até o fim do século, com sério agravamento do déficit hídrico do Nordeste. A tendência da redução de chuvas e aumento das temperaturas também aparece para o cerrado, o Pantanal e a porção da Mata Atlântica no Nordeste.

 O relatório, feito com a mesma metodologia do IPCC, será apresentado oficialmente hoje, no estande da Coppe/UFRJ no Parque dos Atletas, pelo Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC). O estudo mostra que o agravamento da seca nesses biomas alteraria diretamente o ciclo de chuvas no Sudeste e no Sul. Isso porque a floresta tem o papel de absorver o vapor d'água do ar, promovendo o equilíbrio local. Sem floresta, por meio dos ventos, toda essa água vai para o Sudeste e o Sul. De acordo com o estudo, o aumento da precipitação na Mata Atlântica das regiões e nos Pampas, no Sul, até o fim do século pode ultrapassar os 30%.

 — O maior risco está justamente nessa mudança do ciclo de chuvas, no padrão de intensidade das chuvas — explica a presidente do comitê científico do PBMC, Suzana Kahn Ribeiro. — As chuvas no Sudeste estão associadas à evaporação das florestas no Norte e ao regime de ventos que as trazem para cá. Acho que o relatório tem isso de muito interessante, convergir a questão do clima, que às vezes fica numa esfera muito científica, para danos muito localizados. E, no caso do Rio, isso é muito importante.

 A situação é mais preocupante nas grandes cidades, com mais de 1 milhão de habitantes, onde a acelerada urbanização as deixou mais vulneráveis a tempestades intensas, enchentes e deslizamento de encostas.

— A própria configuração das cidades dificulta o escoamento das águas. Além disso, os centros urbanos têm ilhas de calor, o que potencializa a alta das temperaturas — alerta Suzana. — Se temos uma chuva intensa num lugar com pouca gente, o impacto é mínimo; mas, se isso ocorre numa área populosa, os danos são maiores.

Fonte: O Globo

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