Brasil ratifica o Acordo de Paris. E agora?

michel-temer-ratificacao-assinaturaO presidente Michel Temer assinou, em cerimônia no Planalto nesta segunda-feira (12), a ratificação do Acordo de Paris.
O Acordo foi construído no ano passado, na capital da França, para reduzir a emissão de gases de efeito estufa dos países e limitar o aquecimento global a no máximo 1,5º C.
Com a ratificação, o Brasil segue os passos de Estados Unidos e China, que também ratificaram o Acordo. Para que o texto entre em vigor, é preciso que pelo menos 55 países, representando 55% das emissões, também ratifiquem o texto.
Até o momento, 27 países representando 39,8% das emissões já ratificaram.
Com a assinatura de Temer, o Brasil se compromete a cortar 37% das emissões até 2025. Como o país fará isso? ÉPOCA conversou com Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, uma rede de 40 organizações da sociedade civil que atuam com clima e meio ambiente. Segundo ele, é louvável que o Brasil ratifique o acordo, mas agora é preciso avançar e começar a discutir a descarbonização da economia.
ÉPOCA – O governo brasileiro ratificou o Acordo de Paris. O que acontece agora? Uma vez ratificado, o Acordo tem de entrar na legislação, descer para estados, municípios?
Carlos Rittl – É necessário, além da ratificação, um decreto oficial. Mas esse decreto só vem depois de o acordo entrar em vigor [quando 55 países, representando 55% das emissões, ratificarem o Acordo]. Para traduzir internamente os compromissos firmados, será necessário um ajuste da Política Nacional de Mudanças Climáticas. O Brasil precisa, como todos os outros países, entregar para a Convenção do Clima sua estatégia de desenvolvimento, a longo prazo, compatível com os objetivos do acordo. Isso vai requerer um exercício que vai muito além da política. A vantagem de ratificar cedo é que podemos antecipar as ações, preparar o país para seguir no trilho das metas.

ÉPOCA – O Brasil tem um problema de metodologia e contabilidade de seus números de emissões. Como fica isso? A ratificação é em cima dos números apresentados em Paris e não dos números revisados?
Rittl – De fato, nós temos esse problema. O compromisso brasileiro não menciona a qual inventário de emissões está se referindo, e o Terceiro Inventário aumenta em pelo menos 25% as emissões de 2005, que é o ano-base das metas brasileiras. Esse esclarecimento é uma cobrança que a sociedade civil já fazia durante a Presidência deDilma Rousseff. Nós esperamos que o governo atual abra esses dados e esclareça esses números. Isso precisa ser feito, porque ainda há muita dúvida sobre qual é o tamanho do ajuste que o Brasil está disposto a fazer.

ÉPOCA – Em termos práticos, o que tem de ser feito agora? 
Rittl – Precisamos começar a falar de descarbonização da economia. Atualmente, temos o risco de aumento de desmatamento na Amazônia e continuamos aumentando ano a ano o percentual dos investimentos em energias fósseis. O Plano Agricultura de Baixo Carbono recebe apenas 1,6% dos recursos para a agropecuária, o que é um absurdo, considerando todo o pontencial para a redução de emissões. Precisamos reorientar a economia e fazer uma discussão séria sobre desmatamento.

O que esperamos é que haja essa indicação de mais ambição por parte do governo. O próprio ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, disse que o aquecimento global precisa ficar abaixo de 1,5º C. Isso exige mais ambição. É louvável o Brasil ratificar o Acordo, mas precisa vir com mudança na orientação de nosso desenvolvimento, já pensando na massificação das energias renováveisNeste ano, a eólica está gerando 50 mil empregos, mesmo com toda a recessão econômica. O setor solar está engatinhando, mas tem um potencial imenso.

Resumindo: desmatamento zero, restauração florestal, descarbonizar nossa matriz energética e massificar o crédito agrícola para agricultura e pecuária de baixo carbono.

ÉPOCA – Podemos ser otimistas de que o Acordo de Paris entre em vigor ainda neste ano?
Rittl – Sim. O Brasil vai ratificar agora, China e Estados Unidos fizeram no começo de setembro. São três grandes emissores. A Índia já indicou que vai ratificar ainda este ano, e na União Europeia existe uma discussão interna muito forte para que isso aconteça o mais rápido possível. Acho que a gente tem boas chances de, até o final do ano, atingir os números que são importantes – 55 países e 55% das emissões. A entrada em vigor ainda neste ano pode permitir acelerar as mudanças. E isso é fundamental. O Acordo de Paris não salvou o clima do planeta. Salvou a chance de evitar que o clima caminhe para ao caos. Criou condições para colocar o mundo nos eixos. Mas ainda estamos no rumo do caos, que é um aquecimento global acima de 3º C. Com pouco mais de 1º C já sofremos impactos e estamos pagando um preço muito alto. Só neste ano, até agosto, 22% dos municípios brasileiros decretaram situação de emergência ou calamidade pública por desastres naturais, segundo a Defesa Civil. Chuvas, enxurradas, secas, estiagens, tornados, deslizamentos. Precisamos agir em várias frentes.

Fonte: Época

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